Irei
começar uma nova categoria no meu Blog, serão as “Citações”, pois muitas vezes,
há nos livros trechos tão intensos, tão belos ou tão inteligentes, que temos
vontade de congelá-los no tempo e na memória. E como memória não é meu forte,
irei registrar essas passagens aqui.
Vale
lembrar que NÃO serão todas as passagens interessantes dos livros, mas sim,
alguns trechos, aqueles que a oportunidade, a viabilidade e o conteúdo me
permitiram registrar.
Sem
mais delongas, eis as citações do meu último livro lido:
Doutor Jivago –
Boris Pasternak
Pag. 63 – “ A ressurreição. Sob a forma grosseira por que
é formulada para consolo dos fracos, essa ideia me é estranha. O que Cristo
disse dos vivos e dos mortos sempre o entendi de modo diferente. Onde iriam pôr
toda essas multidões reunidas no decorrer dos milênios? O universo inteiro não
lhes bastaria e, por Deus, o bem e a razão deveriam ceder lugar; seriam
esmagados nesse acotovelamento ávido e bestial.
Mas
uma vida sempre idêntica e infinita é o que enche o universo e se renova de
hora em ora, em inúmeras combinações e metamorfoses. Tu, por exemplo, indagas
com inquietação se vais ressuscitar; no entanto já ressuscitaste quando
nasceste, sem mesmo o teres percebidos.
Irás
sofrer, tem a carne consciência de sua
ruína? Em outras palavras, que sucederia à tua consciência? Mas, que é a
consciência? Vejamos isto um pouco. Querer dormir conscientemente é ter insônia
na certa; esforçar-se por ter consciência do trabalho da própria digestão é
correr para um desarranjo nervoso. A
consciência é um veneno, um instrumento de auto-intoxicação, para quem a aplica
em si mesmo. A consciência é uma luz dirigida para fora, a consciência ilumina
a estrada a nossa frente, para evitar que tropecemos.
A
consciência é um farol aceso à frente de uma locomotiva; se for dirigido para
dentro dela, virá a catástrofe.
Que
acontecerá, então, à tua consciência? Olha que digo: tua consciência. Mas tu mesma, que és? Aí está toda a questão.
Vejamos isso mais de perto. Que sentes, de que parte do composto que és tens
consciência? De teus rins, de teu fígado, de tuas veias? Não. Rebusca em tuas
lembranças e só te surpreenderão voltadas para fora, para a ação, para a obra
de tuas mãos, para tua família e para os outros. E agora, escuta-me bem. O
homem presente nos outros, justamente isso é que é a alma do homem. Eis o que
tu és, eis o que respirou, aquilo de que se alimentou. Aquilo que bebeu durante
toda a vida a tua consciência. Isto é ta alma, tua imortalidade, tua vida nos
outros. E então? Nos outros foste, nos outros serás. E tudo o que te puder ser
feito a seguir, isso chama recordação. Serás tu, entrada na composição do
futuro.
Um
última coisa, por fim. Não tens por que inquietar-te. A morte não existe. A
morte não nos diz respeito. Falaste de talento: isto, sim, é outra coisa, é
nosso, nós é que o descobrimos. E o talento, no sentido mais alto e mais vasto,
é o dom da vida.
Não
haverá morte, disse São João. Vê como sua argumentação é simples. Não haverá
morte, porque o passado foi resolvido. É quase como se ele dissesse: não haverá
morte porque isso é conhecido, porque é história antiga e não nos diverte mais;
agora, precisamos do que é novo, e o que é novo é a vida eterna.”
Pag 335 – “... erguia-se uma bela sorveira soltaria, cor
de ferrugem, a única de todas as árvores que conservava suas folhas. Estava
plantada sobre um montículo que dominada
torrões de terras pantanosas e elevava para o céu os corimbos d suas bagas
duras dum vermelho vivo, que se abriam sobre o céu cor de chumbo dos primeiros
dias de chuva e de neve do inverno que
começava. Passarinhos de plumagem brilhante como a aurora das manhas de geada,
melharucos, pousavam sobre a sorveira e bicavam lentamente as grossas bagas de
sua escolha, depois, levantando vivamente a cabecinha e estendendo o pescoço,
engoliam com esforço.”
![]() |
Passarinho Melharuco |
Observando
essas citações, é até estranho pensar que o tema do livro seja a vida de um médico
durante o período conturbadíssimo que
vai desde o domingo sangrento em 1905, passa pela 1ª guerra, Revolução Russa,
NEP e chega até os pés da 2ª Guerra Mundial.
No
livro há tanta delicadeza, gentileza, tanta inteligência e riqueza interior que
é por vezes desconcertante ter como pano de fundo a guerra, a violência e a
deterioração humana.
Livro
e autor incríveis! ..... Afinal, Boris
Pasternak ganhou o Prêmio Nobel em 1958, não era de se esperar menos!!!
3 comentários:
E quando a vida eterna deixar de ser novidade o que nos divertirá será o contentar-se em querer estar presente, mesmo na ausência...
Doutor Jivago possui tantas citações incríveis que eu fiquei louca de vontade de grifar meu livro. Mas acho que ainda me falta coragem, por enquanto pelo menos. Pretendo reler um dia, só pra poder anotar todas as maravilhosas e sensíveis passagens escritas pelo Pasternak.
Mas essa prosa poética encanta de uma forma!!!
O livro todo merece ser grifado mesmo hahaha
;*
Postar um comentário